Nunca nada foi tão claro para mim. E o momento não se repetirá no tempo. Esta é a minha busca. Esta é a minha missão no mundo.
Farto-me de falar do Passado, do meu Passado, porque sempre senti que era lá que estava a chave para compreender o que fazer com o meu Presente. Porque o coração sempre soube que era lá que nascia o meu Futuro.
É isto que quero fazer. Sem dúvida alguma. Ajudar os outros. O outro. A encontrar-se.
(Ana Thomaz de Oliveira)
Muitos são os que me rodeiam que já não suportam ouvir-me falar de quando aconteceu isto ou aquilo na minha vida, mostrando sempre que queria voltar atrás no tempo. Hoje, sentimos saudades porque o Covid-19 nos obrigou a um distanciamento social. Eu não sinto muito mais saudades das minhas pessoas do que já sentia antes. E não estive mais com elas do que habitualmente. Mas estive da mesma forma: à distância. A proximidade é algo que, hoje em dia, sinto de muito poucas pessoas, para além do meu filho. A proximidade inequívoca. E essas são as pessoas que levarei comigo para sempre, na viagem do meu eu pela vida. As outras pessoas, provavelmente, continuarei a guardá-las na memória, mas serei cada vez menos delas. E elas, definitivamente, já terão deixado de ser minhas há muito. Ou não o terão sido sequer. (E, sim, tenho pena disso.)
Olho para a Menina que fui. Aquela que foi esquecida por todos. Inclusivamente por mim. Cresci a olhar para ela, sem a compreender eu mesma. Sem lhe dar a atenção devida. Via todos a ignorá-la, então, ignorei-a eu também. Também eu acreditei que ela não era importante, que nunca era o momento dela. Tornei-me petulante, mimada, rebelde, irreverente, impaciente. Tudo para que as pessoas fossem obrigadas a ver a menina sentada a um canto, a que se habituara a ser constantemente humilhada, enxovalhada, denegrida.
Cresci com todos os meus primeiros laços a serem-me constantemente cortados: os familiares, os vizinhos, os amigos...
Quando passei a viver, de forma definitiva, com a minha própria Mãe, já tinha 5 anos. Ainda não conhecia o meu Pai e não sabia bem o que era ter irmãos, mesmo tendo crescido numa casa com inúmeras outras crianças.
Soube o que era o Amor, pela figura da minha Avó materna, que me criou com o mesmo amor e rigor com que criou todos os filhos e todos os outros netos. Fora o meu filho, foi a pessoa a quem mais beijei. Ou tentei beijar. Sempre que podia, roubava as bochechas da minha Avó para lhe dar um beijinho. Ela fugia sempre. Era uma pessoa bondosa, generosa - talvez a mais generosa e abnegada que eu tenha conhecido na vida - , divertida, temente a Deus. E linda!... Mas que detestava beijinhos. E eu que teimava em dar-lhos, pois era a forma mais bonita, pensava eu - e talvez ainda hoje pense - de dizer 'Amo-te.'
Como alguém que precisa sempre imenso de atenção - por ela me ter sido negada pelos que a deviam ter dado desde o início? - aprendi a não distinguir os momentos para a pedir... ou a não filtrar as pessoas de quem recebia atenção. Isso, a carência afetiva desmesurada, trouxe-me imensos dissabores ao longo da vida. Sobretudo a nível amoroso e sexual, mas não só.
Desde que o meu Pai biológico faleceu, pude compreender melhor que de todas as atenções que me faltaram, a dele foi a que sempre desejei mais. E ele foi o Pai mais presente que conseguiu ser. À distância. Foi um Pai Amigo, tal como assinava nas cartas que me escrevia e que conservo até hoje. Um Pai de quem tive poucos abraços ao longo da vida e cuja falta senti sempre. (A ele, consigo perdoar. - Falarei da importância do Perdão mais para a frente.)
Cresci a idolatrar a minha Mãe. Porque era minha, em primeiro lugar. Porque, fisicamente, era linda, em segundo lugar e isso parecia fascinar toda a gente. Porque ela me contava histórias de como tinha sonhado comigo, da minha saúde frágil desde o início e de como ela cuidara para que eu me mantivesse viva e saudável e das inúmeras lutas, batalhas e sofrimentos para me proteger do alegado descaso da minha família paterna em geral e do meu Pai biológico em particular... Hoje em dia, 30 anos depois, isso tem um nome para todos nós e é crime punível por lei: alienação parental.
A minha Mãe fez o melhor que soube fazer. Que conseguiu fazer. Que escolheu fazer. Tornou-me uma das melhores alunas desde a escola primária até ao liceu. Ignorou que eu tivesse uma depressão durante toda a adolescência, mas ainda asim, conseguiu ver-me terminar o liceu com uma média de 15 e ingressar numa Faculdade conceituada na altura - hoje em dia, desacreditada, mas pela sua gestão; porque o método era efetivamente bom. Nunca concretizou o sonho de me ver com o curso terminado. O meu Pai biológico faleceu quando eu estava a meio do mesmo e eu interrompi para fazer a viagem da minha vida a Cabo Verde e, mais tarde, quando tentei reingressar, tive a minha mais grave situação de saúde e não consegui terminar essa licenciatura. Posteriormente, tentei ingressar noutra, já Mãe e a trabalhar ao mesmo tempo, mas abandonei-a logo mesmo no primeiro ano.
E, sim, vivo a abandonar lugares, tarefas, sonhos e expectativas dos outros em mim. Relações.
Farto-me de falar do Passado, do meu Passado, porque sempre senti que era lá que estava a chave para compreender o que fazer com o meu Presente. Porque o coração sempre soube que era lá que nascia o meu Futuro.
É isto que quero fazer. Sem dúvida alguma. Ajudar os outros. O outro. A encontrar-se.
(Ana Thomaz de Oliveira)
Muitos são os que me rodeiam que já não suportam ouvir-me falar de quando aconteceu isto ou aquilo na minha vida, mostrando sempre que queria voltar atrás no tempo. Hoje, sentimos saudades porque o Covid-19 nos obrigou a um distanciamento social. Eu não sinto muito mais saudades das minhas pessoas do que já sentia antes. E não estive mais com elas do que habitualmente. Mas estive da mesma forma: à distância. A proximidade é algo que, hoje em dia, sinto de muito poucas pessoas, para além do meu filho. A proximidade inequívoca. E essas são as pessoas que levarei comigo para sempre, na viagem do meu eu pela vida. As outras pessoas, provavelmente, continuarei a guardá-las na memória, mas serei cada vez menos delas. E elas, definitivamente, já terão deixado de ser minhas há muito. Ou não o terão sido sequer. (E, sim, tenho pena disso.)
Olho para a Menina que fui. Aquela que foi esquecida por todos. Inclusivamente por mim. Cresci a olhar para ela, sem a compreender eu mesma. Sem lhe dar a atenção devida. Via todos a ignorá-la, então, ignorei-a eu também. Também eu acreditei que ela não era importante, que nunca era o momento dela. Tornei-me petulante, mimada, rebelde, irreverente, impaciente. Tudo para que as pessoas fossem obrigadas a ver a menina sentada a um canto, a que se habituara a ser constantemente humilhada, enxovalhada, denegrida.
Cresci com todos os meus primeiros laços a serem-me constantemente cortados: os familiares, os vizinhos, os amigos...
Quando passei a viver, de forma definitiva, com a minha própria Mãe, já tinha 5 anos. Ainda não conhecia o meu Pai e não sabia bem o que era ter irmãos, mesmo tendo crescido numa casa com inúmeras outras crianças.
Soube o que era o Amor, pela figura da minha Avó materna, que me criou com o mesmo amor e rigor com que criou todos os filhos e todos os outros netos. Fora o meu filho, foi a pessoa a quem mais beijei. Ou tentei beijar. Sempre que podia, roubava as bochechas da minha Avó para lhe dar um beijinho. Ela fugia sempre. Era uma pessoa bondosa, generosa - talvez a mais generosa e abnegada que eu tenha conhecido na vida - , divertida, temente a Deus. E linda!... Mas que detestava beijinhos. E eu que teimava em dar-lhos, pois era a forma mais bonita, pensava eu - e talvez ainda hoje pense - de dizer 'Amo-te.'
Como alguém que precisa sempre imenso de atenção - por ela me ter sido negada pelos que a deviam ter dado desde o início? - aprendi a não distinguir os momentos para a pedir... ou a não filtrar as pessoas de quem recebia atenção. Isso, a carência afetiva desmesurada, trouxe-me imensos dissabores ao longo da vida. Sobretudo a nível amoroso e sexual, mas não só.
Desde que o meu Pai biológico faleceu, pude compreender melhor que de todas as atenções que me faltaram, a dele foi a que sempre desejei mais. E ele foi o Pai mais presente que conseguiu ser. À distância. Foi um Pai Amigo, tal como assinava nas cartas que me escrevia e que conservo até hoje. Um Pai de quem tive poucos abraços ao longo da vida e cuja falta senti sempre. (A ele, consigo perdoar. - Falarei da importância do Perdão mais para a frente.)
Cresci a idolatrar a minha Mãe. Porque era minha, em primeiro lugar. Porque, fisicamente, era linda, em segundo lugar e isso parecia fascinar toda a gente. Porque ela me contava histórias de como tinha sonhado comigo, da minha saúde frágil desde o início e de como ela cuidara para que eu me mantivesse viva e saudável e das inúmeras lutas, batalhas e sofrimentos para me proteger do alegado descaso da minha família paterna em geral e do meu Pai biológico em particular... Hoje em dia, 30 anos depois, isso tem um nome para todos nós e é crime punível por lei: alienação parental.
A minha Mãe fez o melhor que soube fazer. Que conseguiu fazer. Que escolheu fazer. Tornou-me uma das melhores alunas desde a escola primária até ao liceu. Ignorou que eu tivesse uma depressão durante toda a adolescência, mas ainda asim, conseguiu ver-me terminar o liceu com uma média de 15 e ingressar numa Faculdade conceituada na altura - hoje em dia, desacreditada, mas pela sua gestão; porque o método era efetivamente bom. Nunca concretizou o sonho de me ver com o curso terminado. O meu Pai biológico faleceu quando eu estava a meio do mesmo e eu interrompi para fazer a viagem da minha vida a Cabo Verde e, mais tarde, quando tentei reingressar, tive a minha mais grave situação de saúde e não consegui terminar essa licenciatura. Posteriormente, tentei ingressar noutra, já Mãe e a trabalhar ao mesmo tempo, mas abandonei-a logo mesmo no primeiro ano.
E, sim, vivo a abandonar lugares, tarefas, sonhos e expectativas dos outros em mim. Relações.
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